terça-feira, 4 de setembro de 2007

Por que não demitir empregado público

Amigo leitor, como tiver a oportunidade de trabalhar em Empresa de economia mista (Governo) achei muito oportuno o texto de autoria de Luis Fernando Cordeiro publicado pelo Estadão que apresenta a nuances jurídicas acerca do processo de demissão dos profissionais empregados em empresas públicas.

Considerando que já estamos no clima do FERIADÃO de 07 de Setembro espero que todos possam descansar, relaxar e reabastecer as forças. Eu vou aproveitar também para elaborar outros textos pessoais que associam os conceitos de psicologia e trabalho.


Estabilidade garantida
Por que não demitir empregado público
por Luis Fernando Cordeiro

É fato que o objetivo das entidades da administração pública indireta é determinado pelo Poder Público (controle), consistindo no transpasse a ela de determinadas atividades públicas.

Em regra, as empresas públicas e sociedades de economia mista devem sempre voltar-se para atividades que inicialmente competiriam diretamente ao Estado, devendo ser evitada a criação destas para o exercício de atividades puramente econômicas (artigo 173 da CF).

No caso das Sociedades de economia mista, que por lei, só podem ser estabelecidas na forma de Sociedades Anônimas (S.A.), de acordo com a Lei 6.040/76, as referidas entidades, cujo acionista majoritário é o Poder Público, deve obrigatoriamente proceder à eleição de uma diretoria, do Conselho de Administração e do Conselho Fiscal.

Importante mencionar, que notadamente, quem define a eleição de ambos os conselhos é o acionista majoritário (poder público), que elegerão a diretoria, cujos componentes são também indicados pelo acionista controlador da sociedade.

Não é difícil imaginar que possa haver um cunho predominantemente político na administração de tais entidades (empresas públicas e sociedade de economia mista), pois na prática, quem determinará quem será eleito é o chefe do executivo.

Nesse contexto, onde algumas dessas entidades são utilizadas para finalidades político-partidárias, não é difícil concluir que empregados concursados vejam-se ameaçados. Não raras as vezes que o administrador, por exemplo, pretende dispensar uma licitação para privilegiar um partidário; quer contratar algum colaborador do partido através de uma inexigibilidade de licitação, pelo falso argumento de notória especialização (artigo 25, II da Lei 8.666/93); etc.

Diante dessas situações, o empregado público, para defender os interesses da entidade, preservando a legalidade e a moralidade desta, não tem garantias para opinar com liberdade, pois pode sofrer represálias e até mesmo ser dispensado sumariamente e sem uma justificativa. Assim, é dentro deste contexto que desenvolveremos o presente trabalho.

Definição de empregado público

Empregado Público em sentido amplo (regra geral), é toda pessoa física (brasileiros ou estrangeiros na forma da lei, artigo 37, I, da CF), que, mediante concurso público, presta serviços de forma pessoal e não eventual ao Estado e às entidades da Administração Pública direta ou indireta[1], pelo regime celetista, mediante pagamento feito pelos Cofres Públicos.

Importante ressaltar que o empregado público, mesmo regido pelas normas da CLT, deverá ser norteado pelos princípios da Administração Pública, como será demonstrado do decorrer deste trabalho.

Tal conceito reflete a regra geral, pois como veremos adiante, em alguns casos, a totalidade dos pagamentos a este empregado não será de forma integral pelos cofres públicos e teremos também exceções ao comando do artigo 37 da Constituição Federal, no que tange à obrigatoriedade de concurso público.

O Ilustre Professor Celso Antônio Bandeira de Melo[2] assim distingue Cargo Publico de Emprego Público:

"Cargo público – cargos são as mais simples e indivisíveis unidades de competência a serem expressadas por um agente, previstas em número certo, com denominação própria, retribuídas por pessoas jurídicas de direito público e criados por lei.

Os servidores titulares de cargos públicos submetem-se a um regime especificamente concebido para reger esta categoria de agentes. Tal regime é estatutário ou institucional; logo, de índole não-contratual.

Emprego Público – Empregos púbicos são núcleos de encargos de trabalho a serem preenchidos por ocupantes contratados para desempenhá-los, sob relação trabalhista.

Sujeitam-se a uma disciplina jurídica que, embora sofra algumas inevitáveis influências advindas da natureza governamental da entidade contratante, basicamente, é a que se aplica aos contratos trabalhistas em geral; portanto, a prevista na Consolidação das Leis do Trabalho"

Conforme preceitua o artigo 37, II da Constituição Federal vigente e a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, a contratação de empregado público deverá ser precedida de concurso público, salvo para a contratação de “Agentes Temporários”, que são pessoas físicas que trabalham para o Estado, sem concurso público, regidos pela CLT, contratados em razão de excepcional interesse público, pelo critério da “urgência e relevância”, um exemplo seria a contratação de médico em caso de epidemia (artigo 37, IX da CF, regulado pela Lei 8.745, de 09.12.93, alterada pela Lei 9.849 de 26.10.99), e, os contratados pelo critério da confiança, que poderão ser exonerados “ad nutum”. A inobservância desta regra, após o advento da Constituição de 05.10.1988, ou seja, sem prévia aprovação em concurso público, torna a contratação nula, conforme a Súmula 363 do TST.

Empregado público da administração direita e indireta.

O empregado público, via de regra, de acordo com a EC 19, trabalha nas Empresas Públicas, e nas Sociedades de Economia Mista[3], mediante concurso, sem estabilidade (OJ – 229 SDI-I), porém, podemos afirmar que ainda existem empregados públicos que trabalham na administração pública direta, que foram admitidos antes da Constituição Federal de 1.988, e possuem estabilidade[4], conforme orientação jurisprudencial 265 da SDI - I.

Já os Agentes Delegados são os Concessionários e os Permissionários de serviço público, que de acordo o artigo 175 da CF é pessoa contratada pelo Estado, mediante licitação, para realizar serviços por sua conta e risco, assim, os empregados dos Concessionários e dos permissionários não são empregados públicos, sendo empregados comuns de uma empresa privada, não estando sujeitos aos princípios da Administração Pública.

Princípios que norteiam o empregado público e a administração pública.

Conforme foi supra mencionado, o empregado público, via de regra, presta serviços para uma empresa pública ou uma sociedade de economia mista, que fazem parte da Administração Indireta. Assim, estão sujeitos aos princípios que norteiam a Administração Pública, são eles: a) no artigo 37 “caput” da CF: legalidade; Impessoalidade; Moralidade; Publicidade; e, Eficiência (EC 19); b) no “caput” do artigo 70 da CF: Legitimidade, Economicidade; c) §4º do artigo 37 da CF: Probidade; d) artigo 5º, LXXVIII da CF (EC 45): razoabilidade; e) artigo 93, XIII da CF (EC 45): Proporcionalidade; e, f) artigo 93, X da CF: Motivação.

De todos esses princípios que norteiam o empregado público, o que nos interessa neste trabalho é o Principio da Motivação, que será estudado com maior profundidade nos capítulos posteriores.

Da necessidade do Processo Administrativo e Sindicância nas Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista.

Neste ponto a doutrina diverge na necessidade de Processo Administrativo e Sindicância em face dos empregados públicos nas Empresas Públicas e nas Sociedades de Economia Mista.

Para os que defendem a desnecessidade de processo administrativo e sindicância para os empregados públicos, eles o fazem embasados no artigo 2º da Lei 8.112, de 11 de Dezembro de 1990 (lei que regulamenta o processo administrativo e a Sindicância), que diz: “artigo 2º. Para os efeitos desta Lei, servidor é a pessoa legalmente investida em cargo público”(g.n.), ou seja, excluindo os empregados públicos.

Já para o ilustre professor paulista, titular da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, Dr. Diogenes Gasparini[5]:

“As empresas governamentais (sociedades de economia mista, empresa pública e fundação) também sentem necessidade de registrar seus atos, de controlar seus servidores e de decidir sobre certa controvérsia, de sorte que a utilização do processo administrativo para consubstanciar cada um desses fatos é imprescindível. Desse modo, pode-se afirmar que, “mutatis mutandis”, aos processos aplica-se o regime dos processos administrativos que comumente são instaurados na Administração Pública direta.”

Compartilha do mesmo entendimento a Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, em sua obra “Direito Administrativo”[6], quando menciona a inclusão da expressão “emprego” no artigo 20, parágrafo único da Lei 7.347/85, o “afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.” (g.n.)

Dispensa arbitrária, sem justa causa e dispensa imotivada (ou desmotivada).

Em linhas gerais, a dispensa arbitrária é a que não se funda em um motivo técnico, econômico ou disciplinar; esses motivos são extraídos analogicamente do art 165 da CLT, já a dispensa sem justa causa é a que não se fundamenta em qualquer dos motivos previstos em lei; exemplos: rol do artigo 482 da CLT, art 433, II, art 508, art 158 § único e art 240 § único, todos da CLT; Lei 6.354/76, artigo20; Decreto 95.247/87, artigo7º, §3º.

Para o Professor Mauricio Godinho Delgado[7], a dispensa imotivada (ou despedida desmotivada) é assim entendida:

“há a despedida desmotivada, também conhecida como dispensa arbitrária ou despedida sem justa causa. Aqui, reitere-se, a expressão dispensa desmotivada traduz a idéia de falta de um motivo legalmente tipificado.”

Já para o Ilustríssimo Professor Amauri Mascaro Nascimento[8] a dispensa arbitrária diferencia-se da dispensa por justa causa nos seguintes termos:
“enquanto a dispensa arbitrária é qualificação do ato praticado pelo empregador, justa causa, ao contrário, o é da ação ou omissão do trabalhador. A arbitrariedade é daquele. A Justa causa é deste.”

Ao que nos parece, a dispensa imotivada (ou desmotivada) é aquela que não se funda em nenhum motivo, seja um motivo técnico, econômico, financeiro ou qualquer outro tipificado ou não.

Princípio da Motivação e a Teoria dos Motivos Determinantes;

O Princípio da motivação no nosso ordenamento jurídico pátrio vem esculpida no artigo 93, X da Constituição Federal de 1.988, devendo ser explicitadas as razões de fato e de direito do ato da Administração Direta ou Indireta.

A motivação é necessária para todo e qualquer ato administrativo, consoante já decidiu o STF (RDP, 34:141), ou seja, nos atos vinculados ou discricionários (artigo 50 da Lei 9.784/99), pois pode-se afirmar que a falta de motivação ou a indicação de motivos falsos ou incoerentes torna o ato nulo, conforme decisões dos nosso Tribunais (RDA, 46:189 e RDA, 48:122). Assim, a sua obrigatoriedade se justifica em qualquer tipo de ato (isso inclui a motivação da dispensa do empregado público), porque se trata de formalidade necessária para permitir o controle de legalidade dos atos administrativos.

Para o renomado professor Diogenes Gasparini[9], o motivo é “a circunstância de fato ou de direito que autoriza ou impõe ao agente público a prática do ato administrativo”, e continua dizendo que “O motivo pode estar, ou não, na lei”.

Revista Consultor Jurídico, 25 de julho de 2007

Sobre o autor
Luis Fernando Cordeiro: é advogado, especialista em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo-USP, professor da Graduação e do Curso de Pós Graduação da Universidade Nove de Julho.

3 comentários:

christiane disse...

gostei do blog me ajudou muito no trabalho da faculdade

Anônimo disse...

Gostei muito, mas falta postar as "notas de rodapé" e "bibliografia completa".

Unknown disse...

o autor desconhece as ultimas decisões TST acerca das demissões de empregados de sociedade de economia mista...."DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. A empresa estatal, seja qual for o seu tipo, dedicada à exploração da atividade econômica, está regida pelas normas trabalhistas das empresas privadas, por força do disposto no art. 173,§1º, da Constituição Federal. Assim, dada a sua natureza jurídica, pode rescindir sem justa causa, contratos de empregados seus, avaliando apenas a conveniência e a oportunidade, porque o ato será discricionário, não exigindo necessariamente que seja formalizada a motivação."